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segunda-feira, 29 de julho de 2013

Você guarda o que não precisa?

Livre-se do peso dos objetos desnecessários na sua vida. Nem sempre "quem guarda o que não presta, sempre tem o que precisa". Viva mais leve.

– Porque não guardar coisas (as camisolas da minha avó).

Minha Avó

Primeiro vou contar uma historinha. A mãe do meu pai ficou viúva quando eu era bem pequeno. Eu era o único neto e morávamos no mesmo prédio. Como uma forma de compensar a perda eu ficava muito tempo com ela. Dessa forma ficamos muito ligados. Meu pai mudou de cidade algumas vezes e ela sempre foi junto (ela na sua casa e nós na nossa). No final de 1999 ela teve um ataque cardíaco e foi internada na UTI. Lá permaneceu por pouco menos de um mês e acabou falecendo, de um modo tranquilo, aos 86 anos.

Dias depois, meu pai e minha tia foram realizar a dolorosa tarefa de inventariar os objetos que ela tinha em casa. Minha avó não tinha herança, nem joias ou dinheiro. Apenas algumas fotos e poucos móveis sem valor. Porém, um item chamou a atenção deles, eram as 10 camisolas sem uso que ela guardava. Eram camisolas de “velhinha”, sem nenhum charme ou graça, somente eram novas e intocadas. Minha tia disse que ela guardava as tais camisolas para um dia que ela precisasse ser internada por uma doença qualquer, para ficar “bem apresentável” para o pessoal do hospital.
A ironia, segundo o meu pai gosta de falar, é que ela guardou tantas camisolas por tanto tempo e acabou morrendo nua no leito de uma UTI. Realmente ela não teve oportunidade de usá-las no hospital. Meu pai e minha tia acabaram dando tudo para um asilo.
Essa história, contada à exaustão pelo meu pai, sempre me vem à cabeça. Por que guardamos o que não precisamos?


- Acumuladores (empilhando lixo).

Vários de vocês já devem ter visto o programa do Discovery Home & Health chamado “Acumuladores” (“Hoarders” em Inglês). Se vocês não viram deem uma olhada no site do canal. Aliás, a primeira vez que ouvi falar do distúrbio foi sobre o caso dos irmãos Collyer, que o site explica melhor.
É claro que estamos falando de casos extremos de pessoas que guardam coisas até ficarem, literalmente, submersas no acúmulo. O programa inclusive mostra dois tipos básicos de acumuladores: os que guardam objetos na esperança (na verdade uma desculpa) de usa-los um dia, e aqueles que guardam tudo o resto do que consomem, acumulando montanhas de lixo. Os dois tipos básicos podem se misturar no mesmo caso em diversos níveis.
É um programa muito triste porque quase sempre os resultados do tratamento, é nulo ou pouco eficaz. Um episódio foi muito tocante para mim (infelizmente não encontrei a referência dele). O dito episódio mostrava uma senhora idosa, aparentando inteligência e cultura, que tinha dedicado a sua vida a cuidar dos pais. Após a morte dos pais ela não via mais sentido na sua vida e passou a acumular lixo dentro de casa. Diante da ameaça do Poder Público de demolir a sua casa ela aceitou ajuda. A única recomendação que ela fez foi que não podia deixar que fosse fora uma bijuteria que o seu pai tinha dado para a mãe. Durante a limpeza da casa a busca desesperada dela pelo anel da mãe, acabou por impedir o progresso daqueles que foram ajudar. O programa termina e nem metade da casa está limpa.
Fiquei pensando qual a utilidade da tal bijuteria para a senhora. Acho que nem ela sabe direito, ela não tem herdeiros para quem deixar o anel e ele não tem valor monetário nenhum, mas mesmo assim ela preferia arriscar a perda da casa a perdê-lo.


- Super organizados (arrumando o acúmulo).

No outro extremo estão as pessoas que têm por obcessão organizar as suas coisas. A minha mãe, por exemplo, tem guardadas roupas de muitos anos atrás, todas organizadas. As blusas são cuidadosamente dobradas e ensacadas uma a uma. Já vi casos bem piores de pessoas que ordenam as roupas por cores e tamanhos. Mas isso não é tão importante quanto o fato da minha mãe ter cada vez mais armários onde ela guarda, roupas, lençóis, toalhas, louça, panelas, etc. Sei que ela não vai poder usar isso tudo nem que viva por mais 100 anos.
Não adianta só organizar o acúmulo de coisas, é preciso avaliar a utilidade real da “coisa”.

- Colecionadores (organizando a inutilidade).

Os colecionadores são um tipo especial de acumulador super organizado. Algumas pessoas têm centenas de objetos iguais, ou com diferenças mínimas, que só eles sabem identificar. Outros têm milhares de itens do mesmo tipo ou que pertenceram a uma pessoa famosa.
Não importa se é um artesanato, uma obra de arte, um objeto histórico ou uma série de objetos como colheres ou carros, se estão te aprisionando, não são um hobby. Se ocupam espaço demais na sua casa não estão te fazendo bem, apenas te dando uma desculpa para se esconder diante de uma atividade obsessiva. Se você acha que tem um valor cultural ou qualquer coisa assim, deveriam estar num museu. Se você não quer doar para um museu nem consegue disponibilizar para outras pessoas (ou se ninguém mais se interessa pelo assunto), você tem um problema.
Só mais um detalhe, o que disse acima também vale para os seus livros que você leu uma só vez, os seus LPs que você não ouve há mais de 10 anos ou a sua coleção de filmes em VHS. Tinha um colega que comprava e lia livros com uma enorme frequência, só que não tinha nenhum livro em casa. Ele lia e dava para outro, sob a condição de que esse outro também fizesse o mesmo. Acho isso bem interessante.

- As coisas lembram pessoas (a transferência dos sentimentos para os objetos).

Uma desculpa que usamos com frequência é a nostalgia. Tal objeto lembra os meus pais (isso é o que falava senhora acumuladora que citei antes). Esse móvel era da minha avó; esse vestido foi usado no meu casamento; esse foi o primeiro sapatinho do meu filho; etc. Veja bem, não quero que ninguém apague o seu passado. Acho que os objetos contam histórias importantes sobre a sociedade e sobre a família. Porém, se você não tem a quem contar a história ou o objeto ocupa muito espaço na sua casa, alguma coisa não está certa. Você está transferindo um sentimento para uma coisa inanimada. Se você não consegue nem imaginar ficar sem tal objeto, está na hora de reavaliar o seus conceitos.
Imagine que você tenha que se mudar, mas que não pode levar um determinado móvel, por ser grande demais, que você adora porque lembra a sua infância. Se você ficar triste, mas aceitar a mudança, você já fez um bom progresso. Talvez o móvel na casa de outra pessoa tenha muito mais utilidade do que para você hoje em dia. Isso também deve ser levado em consideração quando você dá aquele casaco que você usou naquela viagem inesquecível, mas que está no fundo do sue armário pegando mofo.
Sempre lembro da frase que o Anjo colocou no perfil dela: "pessoas valem mais do que coisas".


- A justificativa dos "guardadores" (a desculpa do meu pai).

 Desde criança ouço o meu pai falar um ditado: "quem guarda o que não presta, sempre tem o que precisa". Com o tempo começei a retrucar: "quem guarda o que não presta, sempre tem porcarias em casa".
Nem adianta tentar se convencer que aquela parte de uma tomada que está na sua caixa de ferramentas há dez anos, vai servir para alguma coisa, algum dia. Nem adianta guardar dezenas de arames de prender o saquinho do pão (como a minha mãe faz), achando que vai ter uso para todos eles.

- Viajando pelo Caminho de Compostela (esvaziando a mochila).

Há muitos anos, um conhecido foi fazer o Caminho de Santiago de Compostela (com quase 800km). Na época eu nada sabia sobre o assunto e comecei a pesquisar. Uma das dicas mais frequentes para os viajantes, assim como para qualquer “mochileiro”, é “SÓ LEVAR O QUE VOCÊ PUDER CARREGAR”.
Essa dica é brilhantemente simples. Não estou nem falando do sentido figurado, de carregar o peso das responsabilidades e da culpa. Falo no sentido mais prático. Se você tem tantas coisas que te prendem a ponto de não conseguir levar uma vida plena está na hora de “esvaziar a mochila”.


- A separação (uma oportunidade mal aproveitada).

Pois é, eu tive uma oportunidade de ouro de “esvaziar a minha mochila”. Quando me separei, joguei muita coisa fora, de algumas acabei me arrependendo por certo tempo, mas agora acho que foi o melhor. Sair de casa para ir para um lugar menor, foi a oportunidade de dar livros, discos, roupas e deixar móveis e quinquilharias para traz. Com o tempo acabei tendo que trazer outras para junto de mim. Mas o importante é que me senti mais leve.
Acho que a oportunidade foi mal aproveitada porque imaginava que poderia viver com menos do que tenho hoje. Não que eu queira levar uma vida espartana, só que tenho ainda muitas coisas que não uso e acho que jamais usarei. Além disso, comecei a acumular outros objetos. Um presentinho aqui, uma roupa ali...


- O armário virtual (somos acumuladores digitais).

Enquanto escrevia este post encontrei um post do blog Conector , que fala sobre o acúmulo de coisas no mundo virtual, seja no computador ou “nas nuvens”. Achei interessante e que cabe bem no que estou falando.


- O conselho que eu nem sempre sigo (mas estou dando).

Se você não usa mais, não te serve mais, não pretende usar nos próximos meses, tem uma coisa que lembra alguém... Dê, venda, troque, jogue fora, recicle... E tire esse peso da sua vida.


- De novo a minha avó.

Minha vó, que todos conheciam pelo apelido que era o nome de um passarinho, foi uma pessoa muito querida e que deu quase tudo o que tinha ainda em vida (exceto as camisolas).


FONTES:

- Acumuladores digitais: http://www.oesquema.com.br/conector/2013/03/11/acumuladores-digitais.htm
- Acumuladores – Discovery Home & Health: http://discoverybrasil.uol.com.br/web/homeandhealth/na-tv/acumuladores/






3 comentários :

  1. Apos ler, não pude deixar de comentar. Muito linda a história da sua querida vó. Eu sou uma prova viva de tudo que comentou. Estou pondo em pratica tudo mencionado e garanto que me sinto cada vez mais leve. O mais engraçado e que vc se livra de tudo que consegue e acha que não tem mais nada para por para fora e na outra semana mais lixo vai embora e assim sucessivamente Kkkk não vou contar tudo que aprendi pois este espaço será pequeno mas garanto que e benéfico praticar o desapego. A impressão que tenho e que acumular coisas custa um preço caro. Como se pagasse-mos aluguel para guardar as coisas. Enfim muito bom, parabéns!!!

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  2. Prezado André Santos, não pude responder antes o seu comentário, mas tenho que confessar que ele me tocou. São comentários como os seus que me dão ânimo para continuar a escrever as minhas opiniões e a contar as minhas histórias. Você, mesmo que não tenha sido essa a sua intenção, deu um novo impulso ao blog. Muito obrigado.

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  3. Olha eu aqui de novo, anos após meu primeiro comentário, vou ler suas novas histórias !!!

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